Eu tenho um grande sonho patriótico. Eu quero, um dia, entrar em uma locadora e não ver a seção “cinema nacional”.
Uma vez uma pessoa, ao me ouvir dizer isso, olhou pra mim com aquela cara de “seu estrangeirista vendido”. A verdade é o contrário. Quando eu vejo um filme, brasileiro, americano, alemão ou iraniano, é pelo que ele pode me dar. Diversão, temas pra refletir, emoção, ou apenas minutos de distração. O fato dele ser brasileiro não me dará isso mais ou menos.
Tropa de Elite é um filme policial, Meu Nome não é Johnny uma comédia, o Homem que Desafiou o Diabo uma pornochanchada, Cidade de Deus é um drama de ação, Central do Brasil um drama sem ação e o Quatrilho pertence ao gênero “chatice insuportável”. Já a Dona da História é uma legítima comédia romântica e merece um destaque. Embora bobinho, é uma comédia romântica no molde das inglesas, e melhor que muitas delas. Consegue ser legitimamente brasileiro sem “forçar a barra”, sem ter que afirmar sua “brasilidade” a cada instante. É bom, não por ser brasileiro, mas apesar de ser brasileiro.
Outra coisa insuportável: todo filme europeu cai na sessão “Cult” ou “Interesse Especial”. O Fabuloso Destino de Amélie Poulain não é cult, é uma comédia romântica também, só diferentezinha. Corra Lola Corra é um videoclipe, um filme de ação. Não é mais cult que Matrix ou Clube da Luta. Já “O Cheiro do Ralo” é um filme cult, mas mais precisamente um filme nonsense, mas colocá-lo-ia na seção de comédia sem dor na consciência. Está na de cinema nacional. Ora, alguém que goste do Cheiro do Ralo, não necessariamente gostará de Dias de Nietzsche em Turim ou de Meu Tio Matou um Cara. Não são do mesmo gênero, definitivamente.
Ao colocarmos todos os filmes europeus na categoria de “filmes intelectuais” e todos os filmes brasileiros na categoria “vai lá, assiste, dá um valor pro seu país”, subestimamos estes e superestimamos aqueles. É um desrespeito com a boa produção nacional. Há filmes brasileiros bons e ruins. Olga é Péssimo, Tolerância também, e o Homem que Copiava, apesar de meu asco moral por sua tese, é um filme bom, comparável à produção estrangeira que nos chega. Estamira me deu vontade de vomitar (pode ser porque eu o assisti no cinema mais fedido da face da terra, o Cine Arte Posto 4 em Santos) e Ilha das Flores seria mentiroso e auto-contraditório filmado no país que fosse.
O cinema brasileiro será muito melhor no dia em que não precisar ser brasileiro, em que for “cinema ponto”.
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É impossível, na América (provocação a meu amigo Tomás) passar um 4 de julho sem ouvir milhares de fogos de artifício, por mais que você esteja no sudoeste de Montana. No 7 de setembro deste ano, em Santos (cidade mãe da independência), não ouvi nenhum.
Não interessa que D. Pedro não fosse dado aos estudos, e que fosse português, herdeiro, marionete do José Bonifácio. Ele proclamou a nossa independência de Portugal, e foi uma independência verdadeira, apesar de tudo. Nenhuma história de nenhum país é linda e maravilhosa, feita com heróis saídos da tradição homérica, e feitos de bravura incontáveis. Todos os homens têm defeitos morais, inclusive os heróis, e descartar seu heroísmo por causa disso é jogar fora uma razão, é jogar fora o valor dado à pátria.
D. Pedro, ao voltar a Portugal, tornou-se Pedro IV. É conhecido por lá como “O Libertador”, pois libertou Brasil de Portugal e, depois, Portugal do absolutismo. Também é conhecido como “Rei Soldado”, por pelejar na guerra civil portuguesa de 1832. Era definitivamente um homem de uma coragem rara, principalmente se comparada à baitolagem dos moleques de hoje em dia. Soube se cercar das pessoas certas, e tomar as atitudes necessárias para que o Brasil fosse um país independente. O problema é que, com nossa história, fazemos o mesmo que com nosso cinema: colocamos numa prateleira separada.
Pois eh, Estamira tambem me deu vontade de vomitar. Nao porque era ruim (muito pelo contrario), mas porque a gravacao era feita com uma camera sem suporte fixo que ficava tremendo. Isso para mim eh como tentar ler em um onibus em movimento, me da ansia. 😦
Assino de cima a baixo, Luís Guilherme.
Abraços!
O posto 4 nem é tão fedido…